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SÃO LUÍS – Criado Fórum Maranhense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos

Publicado em 26/11/2024 14:20 - Última atualização em 26/11/2024 14:51

Articulação estadual mobilizou representantes de instituições de diversos municípios maranhenses

Por iniciativa do Ministério Público do Maranhão, em parceria com entidades da sociedade civil e instituições governamentais, foi criado na última quinta-feira, 21, o Fórum Maranhense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos. O colegiado foi instituído, por aclamação, em audiência pública realizada no Centro Cultural do MPMA, em São Luís. O objetivo é promover, no âmbito estadual, ações integradas de defesa do meio ambiente e da saúde da população pelos males causados pelos defensivos agrícolas.

No Maranhão, foram identificadas 211 comunidades tradicionais e assentamentos rurais, em 33 cidades, prejudicados pela pulverização de agrotóxicos. O uso indiscriminado ameaça a vida de pessoas e animais, compromete a biodiversidade, a segurança alimentar e nutricional da população desses municípios.

O titular da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de São Luís, Cláudio Rebêlo, destacou que o fórum maranhense é o 34º criado nestes moldes, no Brasil, dentre fóruns regionais e estaduais. “Não se trata de proibir o uso de agrotóxicos, pois existe uma legislação extremamente permissiva. O Brasil é um dos países que mais permite o uso, tanto na quantidade, quanto nos tipos e espécies. Queremos que esse uso seja realizado da forma correta”.

A procuradora do Trabalho Anya Gadelha, representante do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, destacou que as consequências atingem a população em geral, mas são maiores nos trabalhadores. “Eles são expostos à contaminação e existem estudos comprovando o aumento do risco de câncer”.

Em seguida, o titular da 1ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Luís Fernando Cabral Barreto Júnior, agradeceu os presentes na audiência pela luta em defesa da biodiversidade e combate aos abusos do agronegócio. “O ideal seria um mundo sem agrotóxico, mas nós não temos esse mundo ainda. Mas mesmo nesse mundo existem limites, muitas vezes não respeitados. A dispersão da embalagem de agrotóxico, a reutilização, a entrega a terceiros, tudo isso são problemas que vão afetando os trabalhadores rurais”, pontuou.

Fernando Barreto, Anya Gadelha e Cláudio Rebêlo

Por meio de videoconferência, o procurador Regional do Trabalho de Pernambuco e coordenador do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, Pedro Serafim, ressaltou a articulação maranhense. “O Fórum Nacional, agora com o Maranhão, terá 34 fóruns sobre a temática. Todos devemos atuar com equilíbrio, buscando as melhores soluções para que favoreçam a saúde, o meio ambiente, a economia, enfim, a sustentabilidade”.

O uso de agrotóxicos no território brasileiro cresceu 236% entre os anos de 2000 e 2007, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (ONU). Em 2008, o Brasil passou a ocupar o primeiro lugar mundial em consumo de agrotóxicos, inclusive daqueles proibidos na União Europeia e nos Estados Unidos. Os produtos são nocivos para as pessoas, animais e contamina as fontes de água.

Audiência pública foi realizada na sede do Centro Cultural do MPMA

PARTICIPAÇÕES

Cidivânia Andrade, da Associação Agroecológica Tijupá, uma das organizações que integram a Rede de Agroecologia do Maranhão, afirmou que as organizações recebem pedidos de socorro daqueles que não são vistos. “A gente tem relatos e vídeos com pedidos de socorro de muitas comunidades e agricultores que, infelizmente, em plena pandemia, foram amplamente impactados pela pulverização aérea de agrotóxicos. Não só a contaminação física dos agricultores, mas também a contaminação dos seus alimentos, afetando sua soberania e segurança alimentar e nutricional”.

Cidivânia Andrade

A professora do Instituto Federal do Maranhão (Ifma) e integrante do Núcleo de Estudos em Agroecologia Djanira Rubim, campus Monte Castelo – São Luís, informou que são realizadas pesquisas desde 2013 sobre a contaminação advinda dos agrotóxicos. “Fazemos análises destes pesticidas e percebemos que não apenas os alimentos, mas as águas estão contaminadas e isso é preocupante”, alertou.

Djanira Rubim

A filha de camponeses Kátia Gomes de Sousa, do assentamento Califórnia, em Açailândia, narrou as consequências negativas dos defensivos agrícolas. “Somos impactados até hoje pelos agrotóxicos. A gente mora em um espaço cercado pela monocultura do eucalipto e sofremos com a pulverização dos agrotóxicos, contaminação do solo, da água, das pessoas. Hoje temos casos de pessoas em nosso assentamento que estão morrendo de câncer”.

Kátia Gomes

O líder comunitário Valdivino Silva é do território quilombola São Benedito dos Colocados, em Codó. “Nós estamos discutindo aqui mecanismos que possam nos ajudar a nos defender da morte dos venenos. Eu sou de um território quilombola que já está cercado pelas grandes monoculturas e pelo avanço do agronegócio que só pensa em lucro. Não se pensa em gente de jeito nenhum. Só se lembram do dólar. Muitas vezes nossos governos são culpados porque não olham para o povo pobre como gente”, desabafou.

Valdivino Silva

O quilombola afirmou que a pulverização gera a poluição do ar, das fontes de água, das florestas e dos babaçuais.  “Lá no meu território, onde eu moro, o avião começa a passar no dia 25 de janeiro e continua até 6 de fevereiro para pôr veneno e contamina o riacho que recebe outras águas e isso mata peixe, mata gente, mata caça e causa o maior racismo ambiental naquela região, que é a destruição total e em massa do bioma Cerrado”.

Para a secretária-executiva da Rede de Agroecologia do Maranhão (Rama), Ariana Gomes, o monitoramento realizado pela instituição nas comunidades, a partir das informações repassadas por suas lideranças, confirma o racismo ambiental e o ataque à população pobre em todo o estado. “É um processo gigantesco de violação dos direitos humanos que essas comunidades têm enfrentado. Esse fórum tem um papel primordial de fazer esse enfrentamento e monitoramento das comunidades para combater esses agrotóxicos”.

Ariana Gomes

A contaminação das fontes de água e o impacto na sobrevivência das comunidades tradicionais também atinge os territórios indígenas. O coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no Maranhão, Gilderlan Rodrigues, afirmou que a instituição constatou o aumento dos conflitos pelo avanço da monocultura da soja. “As terras indígenas estão sofrendo um grande impacto por conta dos agrotóxicos porque são grandes áreas pulverizadas e acabam atingindo os rios, principalmente rio Corda e o Mearim. Grandes empresas são responsáveis por essa disseminação de agrotóxicos, tanto pela devastação do Cerrado pela pulverização de venenos nos rios utilizados pelos indígenas”.

Gilderlan Rodrigues

Representantes de instituições públicas e associações comunitárias de diversas cidades maranhenses se manifestaram na audiência pública e igualmente apresentaram demandas relacionadas à preservação ambiental e denunciaram ataques feitos aos pequenos agricultores, pescadores e às comunidades tradicionais.

CONSTITUIÇÃO DO FÓRUM

O regimento do fórum estabelece, dentre vários objetivos, o debate para formulação de propostas e fiscalização de políticas públicas, relacionadas aos impactos negativos dos defensivos agrícolas e transgênicos na biodiversidade. A proposta é que o grupo atue como instrumento de controle social ao propor e acompanhar ações direcionadas ao cumprimento das normas de proteção à saúde.

O grupo se propõe a incentivar e cobrar a realização de estudos e pesquisas relacionadas ao tema, inclusive sobre contaminação de alimentos e alternativas para a substituição dos agrotóxicos. O fórum se compromete a denunciar fatos e receber denúncias relacionadas a danos causados à saúde dos trabalhadores e ao ambiente causados pela comercialização, uso, armazenamento dos agrotóxicos e descarte das embalagens, assim como o aperfeiçoamento dos diagnósticos e tratamento das populações contaminadas por agrotóxicos.

Além disso, o fórum indica a necessidade de fomentar e indicar diretrizes para a orientação de processos voltados para sistemas agroecológicos visando a agricultura em bases sustentáveis.

PARTICIPANTES

Compõem o fórum a Associação Agroecológica Tijupá, Associação de
Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lago do Junco e Lago dos Rodrigues (AMTR), Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (Fetaema), Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Associação Comunitária Saúde e Agricultura (Acesa), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), Conselho Indigenista do Maranhão (Cimi), Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês da Bacia Hidrográfica (Fonasc/CBH), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Rede de Agroecologia do Maranhão (Rama), Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP).

Também aderiram ao fórum a Agência Estadual de Defesa Agropecuária (Aged), Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-MA), Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no Maranhão, Agência Estadual de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (Agerp), Secretaria Estadual de Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop), Secretaria de Estado de Agricultura Familiar (Seaf), Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE-MA), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), Instituto Federal do Maranhão (Ifma) e Universidade Estadual do Maranhão (Uema).

Redação e fotos: Johelton Gomes (CCOM-MPMA)